Senado afasta
Dilma do Planalto. E interrompe o projeto de poder petista
Presidente ficará fora do cargo por até 180 dias,
prazo que a Casa tem para julgá-la em definitivo. Suas chances de voltar ao
posto estão cada vez mais distantes
FORA –
Presidente Dilma Rousseff ficará afastada do cargo até julgamento final(Ueslei Marcelino/Reuters)
Por Laryssa Borges, Marcela Mattos, Felipe Frazão, Eduardo Gonçalves e
João Pedroso de Campos, de Brasília
Às 6h34 desta quinta-feira, o painel do Senado Federal confirmou o
afastamento de Dilma Rousseff da Presidência da República. Por 55 votos a 22,
sem abstenções, os senadores decidiram que a petista deve ser julgada por crime
de responsabilidade. Mas o resultado representa muito mais: com a possibilidade
de que Dilma se safe na votação final hoje muito distante, a Casa começou a pôr
fim à era PT no comando do país. Os 13 anos do partido à frente do Planalto se
encerram de maneira melancólica - com a legenda imersa em escândalos e incapaz
de salvar uma presidente que, ao fim e ao cabo, cai por culpa de sua própria
incompetência.
Diante das crises política, econômica e ética em que o governo
Dilma submergiu o país, o afastamento da petista representa o primeiro passo
rumo à recolocação do Brasil nos trilhos. Mas exigirá do peemedebista Michel
Temer que se coloque à altura do desafio: afinal, a saída de Dilma não tem o
condão de sanar o atoleiro econômico do país. Ou de reduzir o justo
descontentamento nacional com a classe política diante dos escândalos que há
dois anos a Operação Lava Jato começou a desvendar. Será uma dura missão para
Temer.
Dilma pode ficar até 180 dias afastada do comando do país, enquanto o
Senado se volta ao julgamento do processo que tramita contra ela. Segundo a
expectativa do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), contudo, em até
quatro meses a petista enfrentará a derradeira votação - aquela do plenário da
Casa, que pode resultar em seu impeachment e inelegibilidade por oito anos.
Reclusa nos palácios da Alvorada e do Planalto, a presidente acompanhou
com os poucos aliados que lhe restam as mais de 20 horas de discursos no
plenário do Senado. Havia desistido, ainda
na terça-feira, de descer a rampa do Planalto após receber a notificação
oficial de seu afastamento. Julgou que isso prejudicaria seu discurso de
'resistência contra um golpe' - discurso que planeja seguir martelando, ainda
que lhe falte qualquer respaldo na realidade. Dilma ameaça recorrer à Comissão
Interamericana dos Direitos Humanos e seguir apelando ao Supremo Tribunal
Federal - que já lhe impôs uma sucessão de derrotas. Ambas as empreitadas devem
ser em vão. Os ministros do STF foram justamente os responsáveis por definir o
rito do impeachment ora seguido pelo Congresso. Sem que o governo tenha
levantado argumentos que justificassem uma revisão das decisões dos
parlamentares, negaram todos os recursos já impetrados até aqui pelo governo
contra o processo, incluindo o
mandado de segurança apresentado na terça-feira.
Ao negar o recurso, o ministro Teori Zavascki utilizou-se de um
argumento que indica as escassas chances de vitórias futuras do governo na
judicialização do impeachment. "Não há base constitucional para qualquer
intervenção do Poder Judiciário que, direta ou indiretamente, importe juízo de
mérito sobre a ocorrência ou não dos fatos ou sobre a procedência ou não da
acusação. O juiz constitucional dessa matéria é o Senado Federal, que,
previamente autorizado pela Câmara dos Deputados, assume o papel de tribunal de
instância definitiva, cuja decisão de mérito é insuscetível de reexame, mesmo
pelo Supremo Tribunal Federal. Admitir-se a possibilidade de controle judicial
do mérito da deliberação do Legislativo pelo Poder Judiciário significaria
transformar em letra morta o art. 86 da Constituição Federal", escreveu o
magistrado. À perdedora, resta o infrutífero discurso de vitimização. E do
medo.
Na iminência de ver o processo de impeachment consolidado, a cúpula
petista e a própria presidente agora afastada vituperaram, em uma versão
ampliada do terrorismo eleitoral levado a cabo em 2014, que Michel Temer
acabaria com programas sociais e cortaria direitos trabalhistas. Enunciado
esperado de quem promoveu o aviltamento da Presidência da República, afundou o
país em uma dolorosa crise econômica e insiste na retórica irredimível de que
misteriosas "forças conservadoras" querem apeá-la do poder - apesar
da maciça rejeição ao seu governo estampada nas pesquisas de opinião.
O impeachment, que deu mais um passo hoje com a aprovação em plenário do
relatório do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), é um processo jurídico-político
e no Congresso respeitou o amplo direito de defesa e o contraditório. O
advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, apresentou em três ocasiões -
apenas no Senado - a defesa da presidente contra as acusações de pedaladas
fiscais e de maquiagem das contas públicas com a liberação de créditos
suplementares. Em outras três, apresentou diante de deputados a defesa da
petista nas sessões da Câmara.
Ao contrário do que insiste em afirmar no festival de inaugurações que
promoveu no fim de seu governo, Dilma não está - como nenhum político eleito
democraticamente - imune a questionamentos de legitimidade, mesmo com os 54
milhões de votos que as urnas lhe outorgaram em 2014.
A partir desta quinta-feira, o terceiro andar do Palácio do Planalto
será ocupado por um novo inquilino. Michel Temer chega à Presidência com
predicados de que Dilma nunca dispôs, como a habilidade no trato político. Mas
a crise é profunda, e não há espaço para erros nem hesitação.
PSDB e DEM ensaiam discurso pós-oposição. PT segue perplexo
Senador Aécio Neves (PSDB-MG) pediu unidade
nacional após decisão do Senado que confirmou a suspensão do mandato de Dilma
Por: Marcela Mattos, de Brasília
Após mais
de 20 horas, Senado aprova processo de impeachment e afasta Dilma Rousseff -
12/05/2016(VEJA.com/Ag. Senado)
Depois de quase catorze anos na oposição, as legendas adversárias do PT
preparam-se agora para mudar de lado - e colaborar com o governo interino de
Michel Temer, que será notificado sobre o afastamento de Dilma Rousseff às 11h
desta quinta-feira. Derrotado pela hoje afastada presidente Dilma Rousseff nas
eleições de 2014, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) pediu unidade nacional após
decisão do Senado que confirmou a suspensão do mandato de Dilma. "É
preciso que todos nós nos unamos, todos nós possamos dar nossa contribuição
para que essa nova página seja escrita", afirmou.
Aécio prevê que o afastamento de até 180 dias seja um caminho sem volta
para Dilma e que, portanto, Temer conclui o mandato de sua antecessora. O
tucano evitou falar de participação direta no governo do peemedebista e disse
que a contribuição que seu partido poderá dar será refletida no apoio à
aprovação de propostas estruturantes, como a reforma política. "O que
esperamos é que o governo que agora assume, com base no que determina a
Constituição, se coloque à altura das expectativas e dos enormes desafios do
país. Um governo enxuto, um governo efetivo do ponto de vista das propostas que
venha a apresentar e que já hoje, no máximo amanhã, apresente ao Congresso
Nacional um conjunto de medidas que sinalize de forma clara para o início de
uma nova fase na história do Brasil", afirmou o tucano.
Na mesma linha, o líder do DEM, senador Ronaldo Caiado (GO), fala em
"avaliar" as propostas do governo Temer e cobra que o novo presidente
coloque em prática a pauta construída pelos movimentos de rua e pela sociedade
brasileira. Assim como Aécio, ele cobra que o peemedebista reduza a máquina pública.
"Agora a responsabilidade do novo presidente Michel Temer é fazer sua
tarefa de casa, cortar na carne, cortar ministérios, cortar mordomias e
comissionados. É mostrar exatamente à população que nós não podemos mais
conviver com a prática nem o modelo político-partidário implantado pelo
PT", afirmou.
Já entre os poucos aliados de Dilma que restaram, o clima é de
perplexidade e de procura por uma solução que evite a confirmação do
impeachment da petista. Líder do governo no Senado, Humberto Costa (PE) voltou
a falar em "golpe" contra a presidente afastada e prevê uma
"luta" em diversas frentes - no Congresso, nas ruas e no poder
Judiciário. Ele, porém, não disse se o partido irá recorrer da decisão e admite
dificuldade em reverter o resultado: "Em princípio, o Supremo Tribunal
Federal tem dito que esse é um problema que o Senado tem de resolver",
afirmou.
Em momento raro no PT, Costa ainda reconheceu os equívocos da gestão de
Dilma que levaram ao seu afastamento: "O governo, na sua relação com o
Congresso Nacional, deixou a desejar. Nós não tivemos o diálogo que era
necessário, falhamos na comunicação com a sociedade, erramos vários pontos na
política econômica e chegamos a essa situação", afirmou. O líder petista,
por outro lado, exaltou políticas públicas do governo do PT e evitou o tom
derrotista: "Muito em breve nós vamos estar de volta", ameaça.
'Líder profundamente impopular': noticiário internacional repercute
afastamento de Dilma
Decisão do Senado foi destaque em alguns dos
principais veículos de comunicação do mundo
Jornal
americano 'The New York Times' repercute afastamento da presidente Dilma
Rousseff(Reprodução/VEJA)
O Senado Federal brasileiro aprovou, na manhã desta quinta-feira, o afastamento da
presidente Dilma Rousseff da Presidência da República. A notícia teve forte
repercussão no noticiário internacional, que há semanas vem dando destaque ao
processo de impeachment da petista.
O jornal americano The New York Times se referiu a
Dilma como "uma líder profundamente impopular" que provocou "a
raiva pública generalizada de um sistema corrupto e uma economia
maltratada". A publicação lembrou que o país passará a ser governado pelo
vice-presidente, Michel Temer, "que tem sido acusado por violar limites de
financiamento de campanha e agora estará sobre enorme pressão política para
conter a pior crise política do Brasil em décadas". O texto ainda ressalta
que a crise política brasileira acontece "enquanto o país luta para conter
a propagação do Zika vírus e apenas a meses dos Jogos Olímpicos do Rio de
Janeiro". Já a emissora CNN considera que o processo de impeachment de
Dilma "não será totalmente calmo", já que seus apoiadores "se
comprometeram a tomar as ruas em retaliação, garantindo uma longa e
potencialmente confusa batalha pela frente".
O jornal britânico The Guardian ressaltou que Dilma foi
a primeira mulher a se tornar presidente do Brasil e que a sua popularidade
"despencou junto com a economia". A publicação lembrou que seu
afastamento acontece "a menos da metade do fim de seu mandato" e
"coloca problemas econômicos, paralisia política e alegadas
irregularidades fiscais à frente dos 54 milhões de votos que a puseram no
cargo". O texto ainda afirma que muitos dos senadores que vão julgá-la
"são acusados de crimes ainda mais graves" e que o "impeachment
é mais político do que jurídico".
Ainda na Grã-Bretanha, o jornal Financial Times afirmou
que "é provável que Dilma perca o seu eventual julgamento" e que, se
isso acontecer, a presidente deixará o cargo a dois anos e sete meses do fim de
seu mandato. "Isso também dará fim a 13 anos de governo de seu partido de
esquerda, o PT, o mais recente movimento para o centro na política da América
do Sul, que vive o fim de seu boom econômico". A publicação também faz um
questionamento sobre Michel Temer: "Cerimonioso e de fala mansa, com
reputação de ser como uma esfinge, o advogado de 75 anos terá de lidar com três
crises simultâneas. Ele estará à altura desta tarefa?", diz o texto,
referindo-se às crises econômica, ética e política.
O Le Monde, da França, lembrou que "a impopular
presidente acusou diversas vezes o seu vice-presidente de um golpe de
Estado", afirmando que Temer se tornou "um adversário da presidente
desde março", com o fim da coalizão entre PMDB e PT. Já o espanhol El
País chamou a votação do Senado desta quarta-feira de
"histórica" e afirmou que Dilma deve sair do Palácio do Planalto pela
porta principal, "um gesto explícito que quer dizer que ela acata mas não
aprova a decisão".
(Da redação)
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